03 dezembro 2006

Às armas



Quando o telefone toca, Gerônimo dá um pulo. Já não era sem tempo. Há muito a notícia era esperada. Mesmo assim, quando chega a hora, é tomado por uma intensa emoção. Um calafrio. Um sufoco na boca do estômago.
Olha com ternura para os filhos que ressonam. Beija longamente a mulher, o tempo do beijo anunciando o tempo da ausência. Dá um tapa na cabeça do cachorro e sai batendo o portãozinho de madeira.
Na frente de cada casa da vila, um homem se despede da mulher e segue os passos de Gerônimo sem dizer nada. Quando o cortejo sonâmbulo vira a esquina, as mulheres fecham as portas e apagam as luzes. Sabem que por muito tempo ficarão sem seus homens.
O batalhão segue pelas ruas, guiado pelo instinto guerreiro de Gerônimo. Levam embrulhos apertados aos sovacos. Era carga preciosa, adivinha quem vê. E não estão para brincadeira.
O suor já desce pelas caras zangadas. Estamos quase lá, diz Gerônimo. Uma esquina, um beco, uma porta fechada com luz por dentro. O homem bate e outro homem entreabre a bandeira superior da porta de dois rolos. Podem entrar.
Entram mudos. Fazem um semicírculo frente a frente com outro formado pelos que já estavam lá. Fixam os olhos na mesa que os separam, pintada de verde, com linhas brancas demarcando os lados opostos em que se defrontarão os adversários.
Abrem os pacotes que trazem nos sovacos. Aparecem caixas muito bem cuidadas que guardam as armas com que se darão os combates. Estão prontos para começar o campeonato anual de futebol de botão.

3 comentários:

Márcio S. Sobrinho disse...

hahahaha :)
que final!

Anônimo disse...

Menino... tanta tensão no texto pra terminar com um joguetinho...!! Ehehehe, muito bom. Devfe abrir o torneio lá de casa, no fim do ano.

Paula Theotonio disse...

E viva o anticlimax!