03 julho 2010

No outro dia

Acordar de manhã e sentir a casa vazia. Como um viúvo. Um deixado pela mulher. Ainda ontem a sala estava cheia. Um ar denso de esperança dificultava a respiração. Como das outras vezes, a cerveja estava gelada, os petiscos davam água na boca, a cachacinha botava ordem nos nervos. Obedecendo ordens da minha mulher, já havia pedido desculpas antecipadas aos convidados menos íntimos pelos palavrões que viriam a ser emitidos nas próximas duas horas por mim e meu irmão.
As previsões de todos os entendidos garantiam uma vitória certa. Não havia com o que se preocupar. Os primeiros 45 minutos deram a certeza de que a sala explodiria de alegria dali a pouco. Bebemos e comemos, todos, com um vasto sorriso nos lábios.
Aí, veio o segundo tempo. Aí o tempo fechou. A impressão que me deu é que um bando de zumbis tomou o corpo dos nossos jogadores. Claro que não eram eles que estavam em campo. Pelo menos não eram os mesmos do primeiro tempo.
A sala já não era a mesma do primeiro tempo. Olhares aflitos, expressões de desespero, impotentes impropérios lançados sem alvo definido. Depois, o gosto amargo do almoço engolido por obrigação, grossos goles de cerveja empurrando o feijão goela abaixo. Quase intocada a enorme travessa de macarronada feita para os vencedores famintos.
Acordar de manhã e dar de cara com cenário da derrota. A sala vazia, a solidão da bandeira sobre a pequena mesa colocada em lugar estratégico de frente para a televisão de LCD comprada a prestação só para ver a copa.
Acordar de manhã e ter certeza de que uma copa não é tão importante assim. O Brasil está aí, às vésperas das eleições. O mundo está aí, às vésperas de uma nova convulsão. Todos nós estamos aí, como bons brasileiros, prontos para exercer a nossa eterna profissão: a esperança.

Um comentário:

Juliêta Barbosa disse...

“Acordar de manhã e ter certeza de que uma copa não é tão importante assim.”

É, Ronaldo, não é tão importante assim, mas como seria bom ver toda essa flama, essa energia e esse entusiasmo a serviço do bem-estar coletivo, num esforço conjunto para mudar os rumos da nossa pátria. Tanta desigualdade social, tanta miséria provocada pela má gestão do dinheiro público, e nós - os brasileiros - ali, atrás de onze homens e uma bola, seguimos firmes, fortes e animados – sem está nem aí – ostentando o orgulho nacional, no peito e na raça, por causa de uma “Jabulani”, quando há segredos a desvendar nos porões, por onde campeia a desonestidade e escoam as nossas riquezas.

Em nenhum momento da nossa história – à exceção das Diretas Já – vimos os brasileiros tão empenhados em mudar, de fato, os rumos da nação... Ninguém veste as cores da bandeira com tanto empenho e orgulho – como faz em época de Copa do Mundo - para defender o Brasil dos seus políticos corruptos que, eleição após eleição, deixa-o mais pobre e envergonhado.

Precisamos mesmo de muita esperança e de mais ação. Bjs