14 outubro 2010

O parto da terra


Um a um, a terra devolve à superfície os trinta e três mineiros que guardou no seu ventre por sessenta e oito dias. É impossível resistir ao poder simbólico do episódio que a mídia nos serve a domicílio.
Um a um, ficamos prisioneiros da tragédia que latejava no meio do deserto chileno. Todos nós ficamos grávidos destes homens que desceram aos infernos e ficaram prisioneiros de suas entranhas. De repente, fomos tomados por um medo atávico. O medo de ser enterrado vivo.
Era preciso resgatar aqueles homens. Não suportaríamos acompanhar a sua lenta agonia. Não suportaríamos, isto sim, a encenação da nossa própria angústia diante da ameaça da morte. Daí ter sido providencial a comunicação com os soterrados. Benditos celulares que nos trouxeram as vozes e depois as imagens da vida a quase setecentos metros de profundidade. Sofríamos, sim, mas estávamos vivos.
De repente, os técnicos se deram conta de que não existia um plano de resgate pronto para a situação. Tudo teve que ser improvisado. Existia, sim, uma tecnologia disponível, mas estava dispersa em diversos dispositivos de diferentes instituições. De repente, o mundo se dá conta de que o valor da vida dos mineiros, como a de qualquer outro trabalhador em qualquer lugar do mundo, é inferior ao das riquezas produzidas por suas mãos.
Diz a mídia que o trabalho nas minas não será mais o mesmo depois do acidente chileno. Não acredito. Daqui a pouco todos nós esqueceremos o sofrimento dos mineiros do deserto de Atacama, assim que uma catástrofe nova atrair os olhos da mídia. Mas enquanto isto não acontece, permanecem em nossos olhos as cenas comoventes desses trinta e três mineiros paridos pela terra. Esses que viveram mais de dois meses de inferno e de lá nos ensinaram o poder da solidariedade e da esperança.

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